O caso, que envolveu uma repreensão a alunos muçulmanos e uma aula sobre o status religioso do país, levanta questões cruciais sobre liberdade de expressão e a gestão da diversidade religiosa no ambiente educacional britânico.
Um professor cristão, cuja identidade não foi revelada publicamente, foi demitido de uma escola não religiosa na Grã-Bretanha e inicialmente impedido de trabalhar com crianças, após uma série de eventos desencadeados por comentários sobre o status religioso do país e a repreensão a alunos muçulmanos que violavam regras escolares sobre práticas religiosas. O incidente, ocorrido no ano passada e culminando em sua demissão em maio de 2024, levou o docente a mover uma ação judicial, apoiada pela Freedom of Speech Union (FSU), questionando os limites da liberdade de expressão em instituições de ensino.
A controvérsia teve início quando o professor repreendeu alunos do ensino fundamental que utilizavam as pias dos banheiros para rituais de lavagem dos pés, prática associada às abluções muçulmanas. De acordo com as normas da instituição, não é permitido o uso das pias para essa finalidade, nem a realização de orações no pátio. A escola, no entanto, disponibiliza uma sala específica para as observâncias religiosas dos estudantes islâmicos.
Durante a repreensão, o docente teria sugerido a um aluno que, caso as regras do colégio não fossem de seu agrado, uma escola islâmica na região poderia ser mais adequada às suas crenças. Ele também teria comentado que a Grã-Bretanha, com sua igreja estatal sob a liderança do monarca, é “tecnicamente um país cristão”. Posteriormente, em uma aula para o sexto ano, o professor abordou o valor britânico da tolerância, mencionando que o Islã constitui uma religião minoritária no país.
Contexto Religioso e Demográfico do Reino Unido
É importante notar que a Igreja da Inglaterra, uma das denominações da Comunhão Anglicana, detém o status de igreja estabelecida ou igreja estatal na Inglaterra, com o soberano britânico (atualmente o Rei Charles III) como seu Governador Supremo. Embora o Reino Unido seja uma nação secularizada com liberdade religiosa, essa ligação histórica e constitucional concede ao cristianismo anglicano um papel único no arcabouço legal e cerimonial do país.
Dados do censo de 2021 do Reino Unido revelaram uma mudança demográfica significativa: pela primeira vez, menos da metade da população da Inglaterra e do País de Gales se identifica como cristã (46.2%). No entanto, o cristianismo permanece a maior religião. O Islã, por sua vez, é a segunda maior religião, com 6.5% da população se declarando muçulmana na mesma região, evidenciando a crescente diversidade religiosa.
Consequências e Ação Judicial
As repercussões para o professor foram severas. Em maio de 2024, ele foi suspenso e, subsequentemente, demitido. Um mês mais tarde, foi notificado de que seria encaminhado à polícia sob suspeita de crime de ódio. Embora a investigação policial não tenha avançado, o docente foi inicialmente impedido de trabalhar com crianças, sob a alegação de ter causado “dano emocional” com seus comentários sobre o Islã. Essa proibição, contudo, foi posteriormente revogada após uma ação judicial bem-sucedida.
Atualmente, o professor está movendo uma ação judicial contra a autoridade local, contando com o apoio da Freedom of Speech Union (FSU), uma organização dedicada à defesa da liberdade de expressão. Lord Young, diretor da FSU, expressou forte desaprovação da situação. “Este professor perdeu seu emprego e quase foi permanentemente impedido de exercer sua profissão simplesmente por indicar a uma classe de crianças muçulmanas que a religião nacional da Inglaterra é o Anglicanismo”, afirmou Young.
Ele criticou ainda o que considera um exagero: “As coisas chegaram a um patamar crítico neste país se um professor pode ser rotulado como um risco por proferir algo inquestionavelmente verdadeiro. Se ele tivesse declarado que o Islã é a religião oficial da Inglaterra, mesmo que falso, duvido que enfrentaria tais problemas.”
O caso reacende o debate sobre os limites da liberdade de expressão em ambientes educacionais, a interpretação das regras de neutralidade religiosa em escolas seculares e o equilíbrio delicado na gestão da diversidade cultural e religiosa em sociedades multiculturais como a britânica.
Fonte: https://guiame.com.br